Porque o comprimento das mangas importa no estilo clássico
Um dos erros cometidos pela maioria dos homens Portuguêses quando usam roupa clássica é terem as mangas do casaco a tapar os punhos das camisas. Isto tapa as vossas mãos e cria menos contraste, o que faz com que os homens pareçam bebés a usar a roupa dos pais. Uma noção errada do comprimento ideal das mangas da camisa costuma ser a causa.
Casaco da Brioni que era do meu Avô, que está demasiado comprido nas mangas
As causas: mangas dos casacos demasiado grandes ou mangas das camisas demasiado pequenas
A maioria dos casos vem de casacos cujas mangas não foram ajustadas correctamente. No entanto, ocasionalmente o casaco pode estar perfeito mas as mangas da camisa terem sidodemasiado encurtadas. Istojá aconteceu comigo e é mais fácil de errar do que eu pensava.
Hoje vamos explorar este tema com um exemplo prático pessoal.
Onde deve acabar a manga de uma camisa?
O conhecimento “geral” dita que a camisa deve acabar na base do polegar, e tem razão: esta é a medida certa. Desta forma ficamos com as mãos destapadas para as podermos usar à vontade.
No entanto, vou vos mostrar um exemplo pessoal do que pode correr mal quando se ajusta excessivamente uma camisa sem querer.
Comparação: comprimento ideal das mangas da camisa vs mangas curtas
Nas fotos abaixo exemplifico com uma camisa feita à minha medida na camisaria artesanal Fidúcia e uma camisa pronto-a-vesir da Giovanni Galli que mandei ajustar numa costureira.
Em ambas pedi para a medida ser a base do meu polegar, mas a manga da camisa da Giovanni Galli ficou demasiado curta, porque fui excessivamente zeloso.
A manga acaba na mão sem o punho estar apertado, e mesmo estando bastante engelhada. Notem a manga do braço de relógio: o punho deveria ser mais largo para não ficar preso no relógio
Estas mangas acabam 1-2cm acima de onde deveriam
Vista de lado com o meu braço relaxado na posicão natural. Notem que a camisa é demasiado curta no comprimento do corpo especialmente atrás, onde deveria cobrir o meu rabo
Com os braços relaxados, a manga não parece demasiado curta, mas está
A camisa da Fidúcia acaba na base do polegar mesmo quando estico os braços
Com os braços esticados, notamos que as mangas camisa da Giovanni Galli estão claramente curtas
A camisa da Fidúcia poderia estar mais comprida atrás, para cobrir o meu rabo
A camisa da Giovanni Galli cobre o meu rabo. Camisas pronto-a-vestir muitas assentam-nos melhores do que a primeira camisa à medida que fazemos, porque o molde ainda está a ser refinado. Notem o excesso de vincos nas costas sugerindo que poderíamos instalar umas pinças
Conclusão: confirmem sempre o comprimento antes de ajustar, e deixem um bocadinho mais comprida do que a base do polegar
Em conclusão, confirmem sempre o comprimento da manga da camisa quando a ajustarem ou se a fizerem à medida. Senão vão acabar com uma manga demasiado comprida que poderia ter sido evitada e que estraga um bocadinho o visual da camisa.
Aconselho a deixarem uma margem na manga de 0,5 a 1cm desde a base do polegar, para garantir que a camisa acaba no sítio certo quando ela se engelhar e encolher ligeiramente durante a sua vida.
Notem os alinhados, as costuras brancas que estão à mostra
Ajustar as calças
Primeiro ajustaram as calças.
O ATC (o meu amigo) decidiu deixá-las ter uma ligeira quebra sobre os sapatos. A Srª Dª. Céu deixou 4,5cm extra de fazenda dentro das aberturas das calças caso se queira soltar no futuro, o que é algo que os alfaiates e fábricas costumam fazer em contraste com as lojas pronto a vestir, que evitam ter tecido “extra” porque poupa dinheiro em larga escala.
Os bolsos das calças não estavam completamente fechados devido a alguma falta de tecido na frente das calças, por isso marcaram essa zona para se soltar.
Finalmente, a cinta foi apertada.
Para quem se esquecer dos sapatos, tal como aconteceu connosco, a Crialme tem um par de prova em todos os tamanhos para garantir que as calças saem como a prova promete.
A verificar a cinta
Ajustar o casaco
Em seguida, estava na altura de experimentar o casaco.
A primeira coisa que notei foi o facto dos alinhados estarem no casaco. Os alinhados são costuras na parte de fora do casaco que estão a segurar alguma parte interior. São geralmente brancos porque também servem a finalidade de verificar o alinhamento do corte do casaco.
Também notei na ausência de botões e de casas para botões, que é de esperar porque só são cortadas e cozidas depois de todas as alterações estarem feitas. Depois de cortar a fazenda e cozer as casas não dá para voltar atrás.
Em primeiro lugar, marcou-se a posição dos botões nas mangas.
Marcar a posição dos botões
Em segundo lugar, quando olhei para as costas do casaco notei que estavam muito engelhadas. A Céu disse que a causa era uma excessiva próximidade da fazenda às costas, por isso a fazenda foi libertada.
Vincos nas costas
Vincos das cistas, vistos de lado
Resultado final: fotos
O resultado final ficou espetacular, especialmente em termos de relação preço/qualidade. O ATC disse-me que o fato é bastante comfortável e que está verdadeiramente noutro patamar que os fatos pronto-a-vestir. Os ombros estão bem, o comprimento tmbém, o trespasse está atraente e as mangas estão no sítio certo.
Fato, impecavelmente combinado com outros acessóriosSobretudo por cima do fatoFato a ser usado no seu habitat natural, o escritório
Preços na Crialme
Por fim, falámos sobre os preços das peças pronto a vestir. Em baixo deixo o preçário aproximado das peças, embora possa ser diferente quando forem à loja.
Peças pronto-a-vestir (preços de entrada porque dependem sempre da escolha de do tecido)
Blazer >= 180€
Colete: não disponível em pronto-a-vestir
Fato >= 260€ a 305€
Calças: 70€ a 100€
Peças à medida (preços de entrada porque dependem sempre da escolha de do tecido)
Conclusão: A Crialme é uma boa escolha para fatos à medida da alfaiataria industrial
Em conclusão, um fato à medida Crialme é uma óptima escolha para quem se quer aventurar num patamar mais refinado e personalizado do estilo clássico masculino. A Crialme é sem dúvida uma referência em Portugal para peças pronto-a-vestir e para peças padronizadas à medida.
Gostei muito da minha experiência lá por isso vou voltar sem sombra de dúvida.
Na minha constante procura pelas empresas, marcas e alfaiates Portuguêses que produzem roupa clássica masculina, não tenho tido sorte em encontrar um fabricante que faça roupa à medida sem ser exorbitantemente caro. Ou encontro marcas de gama de entrada de pronto-a-vestir, como a John Tweed, lojas de pronto-a-vestir com tecidos e marcas caras e boas, como a Rosa Teixeira, ou alfaiates que estão fora das minhas possibilidades.
Até agora.
Já tinha ouvido falar sobre a Crialme através de vários familiares meus, por isso quando um amigo meu, ATC, decidiu subir a fasquia e comprar um fato melhor do que um pronto-a-vestir, sugeri-lhe irmos visitar este sítio que se tornou num mito no meu subconsciente.
Produzem tanto produtos prontos a vestir quanto de alfaiataria industrial (made-to-measure).
O que é a alfaiataria industrial?
A roupa produzida pela alfaiataria industrial é feita à medida com moldes padronizados e pré feitos, e depois ajustados através dum computador com as medidas de cada pessoa.
É um passo abaixo do feito à medida que se espera da alfaiataria artesanal, que desenha os moldes/padrões à mão e consegue ajustar todas as medidas e partes da roupa, mas um passo bastante acima do pronto-a-vestir.
Isto reflete-se no preço: geralmente os fatos da alfaiataria industrial são o dobro do preço dos pronto-a-vestir, e os «bespoke» são o dobro (e por vezes o triplo) dos da alfaiataria industrial, pelo menos em Portugal. Isto é, um fato pronto-a-vestir custa pelo menos 200-250€, um fato industrial pelo menos 400-500€ e um fato artesanal 800€.
Visita à loja e primeira prova do fato à medida da Crialme
Processo da marcação da visita à loja da Crialme
O primeiro passo foi marcar uma visita. Há dois horários diferentes: o da fábrica (Segunda a Sexta-feira, das 9:00 às 12:30 e das 14:00 às 18:00), que é o horário que está no website, e o da loja (Segunda a Sexta-feira, das 10:00 às 12:30 e das 13:00 às 19:30, Sábados 9:30 às 13:00), que é o horário que se vê no Instagram.
Infelizmente não me responderam ao email que enviei para geral@crialme.pt (aparentemente foi para o lixo), por isso ligámos para o número que está no website (+351 255 868 200), que é o número da fábrica, e fizemos a marcação da visita. Há outro número que aparece nos cartões de visita (255 861 604) que talvez seja o número da loja.
Os tempos de espera entre a chamada e a marcação estão entre uma e duas semanas e recomendaram-nos marcar um período de 1:30h para a visita. Marcámos para as 18:30 da Quinta-feira, dia 21 de Novembro.
Primeiras impressões da fábrica da Crialme
A distância do centro do Porto à fábrica é de 35km, e chegámos com 15 minutos de antecedência. Ainda bem, porque tentámos entrar pela entrada da fábrica que estava fechada.
Entrada
Tapete de entrada
Sala de espera
Cartão
Felizmente uma funcionária viu-nos e informou-nos que a entrada para a loja se fazia por outro lado.
Loja da Crialme
Entrámos na loja e conhecemos a Srª. Dª. Céu que nos acompanhou durante todo o processo.
A loja estava bem iluminada, decorada com bom gosto e conseguimos ver um leque grande de produtos, de diferentes estilos e formalidades. Os sapatos interessaram-me logo. Por um lado, vi uns modelos horrendos de cores exóticas que nunca usaria na minha vida, mas por outro vi uns modelos clássicos com preços bastante competitivos: sapatos com a construção «blake» a 130€ e outros «goodyear» (em Português também se chamam «palmilhados») por 200€, da marca Calçado Penha.
Em termos de acessórios têm gravatas, meias, cintos, suspensórios, botões de punho e lenços de bolso, entre outros. Também têm algumas camisas prontas-a-vestir, mas não fazem camisas à medida. Recomendaram-nos o Sr. Fernando Queiroz da Camisaria Fidúcia, no Porto, que eu já conheço e gosto.
Fazer o fato à medida da Crialme
Escolher os detalhes do fato
Depois de termos dado uma vista de olhos pela loja, sentámo-nos com a Srª. Dª. Céu para escolher os detalhes do fato. O meu amigo já tem os fatos basilares, por isso queria fazer um fato clássico e versátil que não se consegue encontrar facilmente em lojas: um fato trespasse.
Aprendi com a Céu, entre muitas outras coisas, que se costuma usar o termo «trespasse» ou «trespasse duplo» no Norte e «assertoado» no Sul.
Sala das amostras de tecidos e fazendas
A fazenda
O ATC escolheu um modelo intemporal com 6 botões, numa fazenda (também se pode chamar tecido) “midnight blue” (que é o azul mais escuro que se pode usar para smokings). Esta fazenda fazia parte do inventário da Crialme, então foi mais acessível do que outras opções.
No entanto, o leque de escolhas de marcas, cores e padrões é quase infinito: Dormeuil, Loro Piana, Holland & Sherry, Colombo, Drago, Zegna e outras.
Fomos informados que é a escolha de fazenda que determina o preço de cada fato à medida na Crialme e não o modelo ou os detalhes que se preferem.
Diferentes opções para casacos trespasse
Comparando azul marinho e “midnight blue”
O forro
Para o forro, azul escuro para o corpo e azul-bebé com uma risca para as mangas e os bibes dos bolsos.
Deram-lhe a opção de ter um pequeno texto bordado no forro do casaco, ou com o seu nome inteiro ou com as suas iniciais. Escolheu a segunda opção num azul bébé (a cor 007) com a «Monotype Corsiva» como fonte tipográfica. Exatamente o que eu escolheria.
Também ofereceram para colocar a etiqueta do tecido (Vitale Barberis Canonico) no interior do casaco, detalhe que foi considerado irrelevante.
Combinação de fazenda, forro e forro para os detalhesOpções de fontes tipográficas para o bordado do forroOpções de cores para o bordado do forro
Para a parte de baixo da gola, que só fica visível quando se levanta a gola para nos protegermos do vento gelado, um tecido azul escuro. Lapelas em bico, que são as únicas apropriadas para um fato trespasse visto que são mais formais, e com picotado.
Opções para a parte de baixo da gola, escolheu-se a mais escura
Os bolsos
Escolheu bolsos de portinhola, ou «com pala», com um terceiro bolso acima do bolso direito, apelidado «bolso de bilhete».
Os botões
Os botões escolhidos foram azuis escuros, a fim de não condicionarem a escolha de sapatos para serem da mesma, porque se fossem pretos ou castanhos condicionariam (no entanto sou da opinião que este fato só se deve usar com sapatos pretos). Para o fim, mantiveram-se as rachas duplas.
Opções para os botões
Calças
Para as calças, preferiu que tivessem presilha em bico centrada na lateral (no cinto), em vez de passadores para o cinto ou só botões para suspensórios.
O cós do cinto (interior das calças) vai ficar às risquinhas azuis bebé, semelhantemente a uma parte do forro do casaco, e terá uma barra de silicone para fazer aderência à camisa para não sair de dentro das calças. Não terão dobras na abertura (cuffs em Inglês), porque dobras tornam as calças menos formais, e para compensar essa falta de fazenda extra que ajuda a fazer peso para as calças caírem mais elegantemente, foi-lhe recomendado adicionar uma «fita guarda-lamas». Curiosamente algo que faltou foi discutir a existência de pregas, por isso assumo que as calças não as terão.
Fita de silicone no cintoPpções para as presilhas nº1Ppções para as presilhas nº2
Com tudo escolhido, era altura de tirar as medidas.
Tirar as medidas
Tirar as medidas das calças
Em primeiro lugar, começou-se pelas calças. Precisava-se de saber qual seria a altura do gancho (que determina onde o cinto vai ficar no nosso corpo). Posto doutra maneira, esta medida determina se as calças vão ser de cinta descida ou subida. O ATC decidiu aumentar a altura ligeiramente, com o propósito de que o cinto ficasse perto, mas não tocasse no umbigo, o que é uma boa escolha para evitar o «triângulo das bermudas».
Depois apertou-se o cinto e ajustou-se a cava do gancho para evitar que houvesse demasiado tecido no rabo. A Crialme deixa 6cm de fazenda extra nas calças para se poder alargar as calças caso engordemos.
De seguida mediu-se o comprimento das calças e depois escolheu-se a largura da abertura das calças nos sapatos, que se aumentou. A largura nas coxas e nos gémeos manteve-se como a original. A Céu recomendou não fazer um corte atrás no cinto em V, para se poder alargar as calças sem se notar.
Apertando o cinto
Escolhendo o comprimento e a largura da abertura das calças
Tirar as medidas do casaco
Passando ao casaco, o ATC começou por vestir um casaco padrão tamanho 50 nos ombros para termos um ponto de referência.
Ombros e comprimento
Manteve-se o comprimento do casaco, que tem de dividir o corpo ao meio (uma boa forma de verificar é ver se conseguimos agarrar no casaco fechando as mãos com os braços esticados, porque os braços dos homens geralmente acabam a meio do corpo). É importante que os ombros sejam escolhidos de acordo com a largura que temos hoje, porque não se podem alargar. No entanto, pode-se apertar os ombros mesmo que não seja eficiente na ótica financeira.
Costas e mangas
Todavia, apareceram vincos horizontais e verticais nas costas, que podem ser causados por falta de largura nos ombros ou por uma inclinação dos ombros que o casaco não está feito para acomodar. Também se teve em conta na orientação dos ombros (dianteiros ou traseiros). Depois rodou-se as mangas para evitar vincos nessa zona. É a beleza de se fazer um fato à medida na Crialme: poder ajustar estes pormenores.
Cinta
Em seguida apertou-se a cinta. Escolheu-se a posição do botão, que é mais difícil de fazer com casacos trespasse. A Srª. Dª. Céu pediu ao ATC para desapertar o botão sem olhar e ele tocou num sítio abaixo do botão atual, o que significa que é a zona mais confortávelpara o botão.
Lapelas
Manteve-se a largura das lapela/bandas/virados. Logo depois, escolheu-se a altura da linha de praça, que separa a gola da lapela, baixando-se ligeiramente.
Vendo os vincos das costas causados por ter os ombros mais inclinados do que o casaco permiteRodando as mangasAltura da linha de praça
Tempos de entrega
Deram-nos um prazo de 1 mês para fazer o fato por isso marcámos a 1ª prova para dia 16 de Dezembro. Disseram-nos para trazer sapatos e uma camisa que se vai usar com o fato, o que fizemos já na primeira visita que recomendo a fazerem, visto que nos deu bastante jeito. Tragam também uma gravata para fechar a camisa, visto que o colarinho fica diferente com uma gravata. O ATC partilhou o seu número de telemóvel para o poderem contactar e, em seguida, a Srª. Dª. Céu deu-nos o privilégio de vermos como se metem as escolhas e medidas no sistema informático. O fato ficou por 450€, que só se paga quando se recebe o produto final.
Folha com medidas
Folha com medidas
Corredor com peças
Preços das peças feitas à medida da Crialme
Em termos de preços, peças à medida dependem sempre da fazenda escolhida, por isso os seguintes preços são os preços mínimos, com o tecido mais em conta, para cada peça:
Calças >= 110€
Colete >= 100€
Casaco >= 260€
Fato >= 400€
Fraque (casaca, calças, colete) >= 700€
Sobretudo >= 400€
Não fiz muitas perguntas sobre preços de peças pronto-a-vestir, mas vimos sobretudos de lã bons, suficientemente compridos e quentinhos por 190€, o que é bastante em conta. Talvez seja o meu presente de Natal para mim próprio.
Sobretudos pronto-a-vestir
Em conclusão, ambos gostámos muito da experiência e esperemos que o fato consiga fazer jus às expectativas. No próximo artigo nesta série sobre a Crialme, vamos falar sobre a 1ª prova do fato e também explorar mais o pronto-a-vestir da loja da fábrica.
Um grande agradecimento à Srª. Dª. Céu que me respondeu a todas as perguntas que eu fiz (e eu fiz muitas, mesmo muitas perguntas).